Um foguete... Sonhei na UTI com um foguete, eu dentro dele viajando a milhões por hora para não sei onde... Aliás, sonhei nada... Cochilei... Não me permitia depois de tudo sonhar, dormir, me sedar... Tive medo de ir e não voltar... Parece exagero, mas era difícil ficar tranquila num lugar onde realmente não esperava estar naquela noite... E não dormi, cantei... Era o que sabia fazer antes de fotografar, de ser jornalista (cantei 8 anos em coral).
Vi uma luminária única no teto a noite inteira, meditei, de tanto mirá-la... Exercitei todos os processos de relaxamento. E já não tinha mais de onde tirar um pensamento zen budista e aí comecei a cantar... Vieram me perguntar se estava tudo bem... Ficar sozinha numa UTI sem sedação é difícil... É ruim ficar só... Queria uma câmera para fotografar... Pensava nisso o tempo todo...
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Dia 28 de junho mais ou menos umas 10h da noite tive uma dor de cabeça... Dias de estresse, a famosa conhecida principalmente em São Paulo "correria". E a gente nem se dá conta, deixa passar... Mas a dor veio... E veio forte. Diagnóstico: AVC-H, derrame, sangramento ou tecnicamente falando, uma hemorragia subaracnóidea perimesencefálica. Na área da meninge... E que área... Enfim, pensei!!!!!!! Como bem diria na minha terra: "me lasquei"!!!!
9 dias no hospital... E parada numa cama durante quase 5 dias. Sem poder sentar ou ir ao banheiro ou tomar banho, a não ser no leito. Mas estagnada não fiquei. Pensei nas possibilidades de sequelas. Agradecia a Deus por ver, por enxergar, por poder saber que fotografar poderia e deveria fazer muito ainda...
Minha audição ficou engraçada... Nos 4 primeiros dias parecia que eu estava numa nave espacial de cinema um som longe, distante, viajante... Ouvia tudo metálico, láaááááááá longe... Quando comia torradas parecia que eu tinha tomado algum letárgico, dava barato... Pelo menos divertido...
Ouvia minha voz como se fosse outra pessoa falando... Mas passou... Acho que felizmente, mas a sensação foi engraçada, prazerosa até... Pude me transportar para um mundo diferente... Em todos os sentidos. Pela audição, pela imobilidade na cama, pelo carinho absurdamente maravilhoso e intenso das pessoas, pelas memória de tudo passando correndo como se eu estivesse em minha bike descendo ladeira abaixo...
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Tomografia com contraste, arteriografia (um fio com câmera que entra pela virilha até o cérebro e esquenta tudoooo, toca fogo no seu juízo literalmente), doppler com contraste, mais todos os exames diários que não te permitem nem sequer descansar durante a madrugada - glicemia, furar os dedos umas 6 vezes por dia, radiografia do pulmão, exame de sangue, soro na veia, medicação em horas alternadas, visita de enfermeiros, médicos, funcionários da limpeza que queriam me ver e blá, blá, blá, blá, blá... Uma rotina corrida até no hospital!! Ufa, socorro!!!
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Vi seu João, paciente já idoso do quarto da frente do meu na UTI arrancar tudo... Ele estava de saco cheio de ficar entubado, de passar todo o tempo naquela rotina podemos afirmar, estressante - obviamente - e foi uma correria de enfermeiros e chefes para socorrê-lo ou aprisioná-lo de novo... Afinal de contas realmente não deixa de ser uma prisão ficar naquele estado sem saber até quando e porque exatamente...
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Poxa, como assim uma moçoila de 36 anos com AVC?? Virei um ET!! Comecei a me sentir um ET...
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Quase soquei um grandão fortão que foi me fazer exame de pulmão às 5h da manhã!!!!!!!!! E falei para ele que ele iria se ver comigo fora do hospital para vingar a hora que ele me acordava todos os dias... Filho de uma mãe!!! Ele riu. Disse que eu era muito simpática... Acho que falou isso para que eu não batesse nele... No outro dia foi um meio fraquinho, franzino, mas já foi logo avisando que lutava karatê e que eu tivesse cuidado com ele... Boas coisas... Humor é o que não faltou no hospital, apesar de tudo...
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Meu quarto enganava os médicos e enfermeiros... Achavam que estavam entrando na realidade não na semintensiva, mas numa pediatria tamanha a quantidade de bichinhos de pelúcia, uma balão de princesa, flor de brinquedo, livros, ipod, revistas, tudo enfim que os queridos e loucos amigos - graças a deus - levavam pra mim para que eu ocupasse meu tempo... Faltou só o escondidinho de charque e o bolo de rolo que senti muita falta... E poxa, como senti falta de pitomba, que desejo!! Enfim...
Na semintensiva podia ler e ver tv, conversar, falar ao telefone... Tudo que aparentemente é banal e que nem percebemos no dia-a-dia com coisas muito legais a fazer... Quando eu soube que já estava com permissão para fazer isso tudo fiquei radiante, parecendo criança... 3 dias depois radiante ficaram todos ao saber que eu já poderia ir ao banheiro sozinha, tomar banho de chuveiro e sentar numa poltrona que ficava ao lado da cama do hospital... O que sempre me acompanhou minha vida inteira desde que nasci foi embora rapidinho nesta experiência sensorial de saúde: minha ansiedade. Tudo eu fazia com muita calma e ouvindo o sr. dr. excelentíssimo meu médico, Carlos Eduardo Roelke, um capixaba muito legal, competente, tranquilo e ariano (faz aniversário no mesmo dia que eu). Comecei a pensar que o fato de estar deitada numa cama de hospital durante dias sem previsão de alta pra nem sequer andar não era a pior da opções...
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Li uma matéria na Revista Vida Simples enquanto estava no hospital que falava sobre a busca pelo perfeito. Boa matéria para ser lida... Na busca pelo perfeito fazemos comparações ininterruptas sobre tudo e todos. Viramos exigentes paranóicos, doentes por fazer o certo. E o que é o certo né? O que é o melhor??
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Vi que quando contava que fazia tudo na cama, que não podia ir ao banheiro, isso era recebido com um choque muito grande... Sim, claro... Mulher ativa, aos 36 anos, anda de bike, come bem, tem pressão baixa, tem um filho lindo, apaixonada pelo marido, muitos amigos, faz o que gosta, numa cama sem poder se mexer direito!!!!!!!?????
Mas aí eu pensava: poxa, e seu João lá, no quarto da frente, que arrancou tudo??? Por que se isso acontece com ele e ainda pior ou não (!?) ele estava sedado e eu não!!! O que era melhor??? Por que a verdade de que ele, aquele senhor idoso ter que ficar imóvel, tomar banho na cama e não poder sair do leito é mais aceita? E a minha não?? Tenho uma "culpa" de ser tão jovem?? Pela minha jovialidade? Enfim, pensei estar sendo injusta eu e todos que pensam assim... Juízo fervilhou demais... Literalmente...
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Semanas antes de imaginar que eu estaria internada, tinha sabido de Antônio Gaudério, fotógrafo renomado da Folha de São Paulo, que num acidente quase que ridículo doméstico - caiu de uma laje enquanto passava um fim de semana com a família no RJ - foi parar num hospital em estado grave!!! E ainda bem, está já fotografando com uma snapphoto algumas cenas da sua rotina diária e tem reagido muito bem ao tratamento e às cirurgias impressionando médicos a respeito de sua recuperação... O seu blog, idealizado pelo fotógrafo e amigo João Wainer, tem recebido depoimentos sobre ele e contado um pouco sobre as visitas dos amigos ao hospital. Vale muito visitar e deixar mensagens e contar histórias para ele... Para sua recuperação e melhora, esses depoimentos são fundamentais.
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Coincidentemente no dia que recebi alta, Gaudério entrava no mesmo hospital que fiquei internada, o Samaritano, em São Paulo.
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Lembro bem que minha recuperação deu um salto fenomenal ao receber a visita de meu filho... Vixe maria, como foi bom vê-lo... No outro dia já tinha melhorado quase tudo, as dores, as tonturas, a terrível queimação na coluna inteira que me dava... Meu sono tinha melhorado, aliás passou a existir de novo...
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Enfim, tudo isso me lembrou muito o grande fotógrafo alemão Helmut Newton, que convalescente num hospital em Nova York depois de ter sofrido um ataque cardíaco, fotografou suas cenas hospitalares em 1971.
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Sem câmera, mas com um celular com uma dentro dele fiz alguns registros que pra mim foram imprescindíveis para me reconhecer e não me perder naquela mudança estranha que acontecia comigo naquele hospital...
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Com amigos fotógrafos ao meu lado, recebi alta me sentindo Paulo Maluf inaugurando uma mega obra em São Paulo... Disparos e mais disparos enquanto fazia minha saída do quarto do hospital quase hotel.
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Pois falar obrigada a todos é como fazer agradecimento em abertura de livro, em encerramento de tese, em discurso de formando, mas agradeço sim com absoluta certeza e necessidade de fazê-lo, a minha família, Gisa, Samuca, dona Mercedes, Alan, Rosinha, dona Diva e família por fazerem eu me sentir especial, Adriana, Marcelo, Yves, Kiara, Aninha, Nando e João, Stefan, Vivi, Camila, Sandra, André, Raul, German, Lia, Fabi, Helinha, Marquinhos, Arnaldo, Malu, Alexandra, enfim todos que não me esqueço por terem adiantado minha recuperação, por terem pensado positivamente e por me fazerem sair logo do hospital!! E aos dr. Jorge Kuhn e dra. Mema!! Vocês me pariram!!!
E aos meus Jean e Pedro... Sempre!
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De novo, à vida... Dia 06 de julho, saindo do hospital... Para não me perder de vista... De jeito algum...
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Esta foto aí abaixo foi por minha amiga fotógrafa, Giselle Rocha. Uma grandiosa dentre os tantos amigos que me ajudaram e me fizeram rir durante este tempo que estive "suspensa"...
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Como já diria o grupo Palavra Cantada que meu filho tanto ouve suas músicas... "tocar o céu com a ponta dos pés, pisar no chão com a palma da mão"... Flutuando... Leve...
Beijos e amanhã tem mais post aqui no blog... Falando de otras cositas fotográficas mais e menos hospitalares...Inté! E bom voltar aqui...De novo...
P.S.: Não tive necessidade e nem queria mesmo ser sedada... Só para informar... Uma louca desvairada mesmo!!! Ah! E sim, quase ia me esquecendo... Depois de tudo vou voltar a cantar, além, claro, de continuar fotografando muito...
21 comentários:
Lu, amiga querida,
tomei um susto danado, já passou...
O seu post/texto é lindo. E o melhor é que termina com o seu belo e habitual sorriso.
Agora vamos esperar pelo sorriso do Gaudério, que espero seja em breve.
Bjo gde.
LUuuuuuuuuuuuu
Que bom ver que vc já está ótima de novo!!! Fiquei aqui de longe torcendo e pedindo notícias aos p´s! Beijão enorme! Feliz de saber que vc está bem!!!
Tão linda a minha amiga! tão forte... tão especial... tão "amiga-irmã-amada"... tão absolutamente necessária!!!!
A gente ficou do lado pra segurar sua mão como uma âncora, pra vc num inventar de sair flutuando pra lugar nenhum!
Beijossssssss, amore!
Dri
Eita... me enganei... eu sou, na verdade, a "INFECTANTE", né? hahahahaha....
Mais beijosssss,
Dri
Luciana, você não faz idéia do susto que tomei quando te liguei e Jean me perguntou se eu não sabia o que tinha acontecido. Fiquei mais branco do que já sou na hora e, felizmente, pude conversar contigo naquele momento, sobre futuro breve, e relaxar ao saber que tudo não passava de um grande susto. Graças a Deus. Saúde e paz a todos.
Ei Lu!!! Que bom ver este sorriso na foto de Gisa e saber que vc continua firme, forte, alegre e cheia de vida!!! Beijo grande querida. E toda saúde do mundo!!! Levanta sacode a poeira e dá a volta por cima neguinha.
Luciana,
não te conheço pessoalmente, mas sou um leitor atento do teu blog, desde muito tempo. Gosto muito do que escreves, das tuas dicas, das tuas fotos. Tava estranhando a tua ausência por aqui,reclamando que não postavas mais nada, quando li este post e levei um baita susto !
Guria, que loucura! Que bom, que tu estás bem novamente.
Saúde, paz e muitas, muitas fotos.
André Feltes
Espero que daqui para frente só acontençam sustos agradáveis, boa volta a rotina!
Abraço de Curitiba,
Milla
Estamos tão longe mas nunca deixamos de estar perto... Que bom que vc voltou normal (se bem que é difícil chamar vc de normal) e voltou com o blog. Quanto a vontade de comer Pitomba, assim que eu ver um vendedor aqui pelos sinais de Recife vou comprar e mandar pra vc, mas num pode ser muito madura né,se não vai chegar ai podre. Promessa é dívida.
Beijos pra tu, Jean e Pedrinho
Luciana,
Que bom ver você. Seu blog (suas idéias) é/são importantes. Minha esposa pegou o DVD do filme de Sean Pean... Por causa de você. Que filme!
Abraços,
Belém.
Luciana,
Há umas horas já deixei meu comentário no Bloco de Notas do Cláudio.
Só agora, vim ao seu lê-la e ler também os comentários de seus amigos.
O que eu disse é nada, nadinha mesmo.
Além de ser linda (um bom acidente da Vida), é Forte, muito Forte. É uma Mulher de Armas!!!
Que Deus a acompanhe por bem mais de 72 anos.
Um bj.
Lu, minha irmã conterrânea. Acabo de saber no Pictura Pixel. Falamos dessas e outras da vida, quando tive aí em abril, na Virada Cultural... Querida, que benção sua recuperação, tão rápida. Deus é pai, grande e misericordioso. Que o teu sorriso ilumine a todos nós, sempre.
Beijos e beijus de tapioca. Ana Araujo
Lu,
Acabo de ficar sabendo do que aconteceu com você. Ainda bem que peguei a história de trás pra frente e, logo de cara, vi a mocinha rindo no final. Final feliz. O único final que sua história poderia ter.
beijos,
anderson
Mulher, que susto enorme. o que a vida não nos traz de surpresas e lições que nos faz repensar a própria vida? Só agora soube do que se tratava seu problema de saúde (que você comentou comigo na Semana do Fotosite). Fico feliz que o pior de tudo já tenha passado e admiro sua força. Continue assim.
um beijo e um abraço. Maíra Soares
Passei um tempão sem visitar o blog e que surpresa, tive uma irmã com o mesmo problema e sou fotógrafo de uma rede de Hospitais. Fique bem! é apenas uma mensagem de carinho, de alguma maneira seu texto me fez alguma diferença. []s
Lu, faz quase um ano e só estou lendo isso agora... Com estão as coisas agora, tudo bem?
Tempo corrido em Recife, para variar. Estarei viajando para Porto Alegre nesta sexta-feira, 22 e só retorno a Recife em 10 de junho. Neste intervalo, talvez dê um pulo em São Paulo para alguns assuntos acadêmicos e, se isto acontecer, entro em contato para te fazer uma visitinha...
Abraços pro Jean e pro Pedro!
Márcio Santana
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